Friday 12 July 2019

Planejamento urbano ideológico: zoning e arranha-céus

No Dezembro 2018 em Curitiba, no fim duma conversa com o Jaime Lerner, ele perguntou-me sobre a Itália. Respondi que aquele que antigamente era conhecido como o “Bel Paese”, hoje é terra pobre e sem futuro, de onde as pessoas com estudos e capacidades fogem. E que é país onde tudo roda à volta da demagogia e ideologia.

O Jaime, sagaz, respondeu que a ideologia tem papel central em qualquer país.

Penso que ele se referisse também ao Brasil, e não só pela “guerra” entre partidos que dividiu o país, transformando a política numa questão de torcida ou de fé, quanto por questões relativas às cidades.

Na minha experiência no maravilhoso Brasil, enfrentei demasiadas vezes a evidência de quanto a ideologia e os interesses privados dos grupos econômicos, e não a ciência, guiam nos processos de planejamento urbanos. Pessoalmente nas cidades brasileiras que visitei não vi nada que tivesse os cidadãos no centro dos pensamentos dos políticos e dos urbanistas, mas um planejamento baseado sobre as necessidades das indústrias automobilística (por exemplo Brasília) e da construção (arranha-céus, em qualquer lado).

Quando em todo o mundo há quase 20 anos se fala de variedade de serviços e mix funcional, no Brasil ainda tem quem fale de zoning, conceito desenvolvido num mundo (os anos 20 do século passado) em que o movimento do futurismo é a melhor manifestação. Falo de um tempo no qual se acreditava que os recursos fósseis fossem eternos e que não procurassem dano algum, e que as máquinas (incluindo os carros) fossem o centro da vida do Homem. Porquê hoje - depois de 90 anos e com o mundo totalmente virado a cuidar do ambiente, das pessoas e do clima - ainda há planejadores urbanos que continuam seguindo os danosos conceitos definidos por Le Corbusier, úteis exclusivamente para favorecer a venda de carros?

Além disso, porquê em várias partes do mundo os arranha-céus são símbolo de pobreza, e não raramente estes formigueiros são bairros sociais verticais onde as públicas administrações encerram os pobres, em quanto no Brasil há quem tem a coragem de vender o “padrão arranha-céu” como sinônimo de bem-estar?

Não é, na melhor das hipóteses, ideologia esta aqui? Porque seja produtores, seja clientes acreditam nisso.

Vão apreciadas e sustentadas as tentativas de algumas construtoras de edificar bairros inspirando-se no “novo urbanismo”, mas os resultados não convencem plenamente: os casos de Pedra Branca (Palhoça/SC), do residencial Villa Flora (Sumaré/SP), do Urban Center Convento (Lajeado/RS), dos Parqville Jacarandá e Pinheiros (Goiânia/GO), parecem ainda baseados sobre o arcaico e danoso sistema do zoning, com edifícios essencialmente monofuncionais. Se trata, portanto, de bairros carro-cêntricos, que recordam mais a slaburbia estadunidense em vez de os agradáveis e “vivos” lugares concebidos seguindo o novo urbanismo. Novo urbanismo que, vale a pena recordar, é filosofia antropocêntrica que não só prevê a construção de centros urbanos com áreas verdes e de jogo para as crianças, mas principalmente centros auto-suficientes, vivos durante o dia todo, com oficinas e vários serviços (incluindo clínicas, escolas, entretenimento e comércio), onde o carro seja não só inútil, mas hóspede não grato.

A Richtergruppe, a CINQ Desenvolvimento Imobiliário, a Imobiliária Rossi e o Grupo Pedra Branca vão apoiados e agradecidos, porque é bom que façam de pioneiros e forneçam um exemplo para outras companhias, porém, é desejável que melhorem a abordagem, planejando bairros totalmente a medida humana. A S.I.D. Consulting nisso pode ter um papel importante.

Portanto, a minha pergunta é: porque os urbanistas no Brasil ainda acreditam (ou são portados a acreditar e fazer acreditar a políticos e cidadãos) que seja necessário construir cidades funcionais aos desideratos dos construtores de carros e dos mais arcaicos empreendedores da indústria da construção? Porque continuam com esta “ideologia”? Porque as imobiliárias não veem a grande potencialidade de construir bairros que respondam às verdadeiras e profundas necessidades de clientes que queiram uma vida plena, serena e feliz para sim e para os próprios familiares? Quanto tempo mais poderá funcionar enganar as pessoas, convencendo-as que um inferno seja um paraíso?

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